Retalhos de memórias alinhavados entre lãs, linhas, notas, telas e lembranças.

Inajá Martins de Almeida

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"Manter um diário ou escrever, as próprias memórias deveria ser obrigação “imposta pelo estado”: o material acumulado após três ou quatro gerações teria valor inestimável. Resolveria muitos problemas psicológicos e históricos que afligem a humanidade. Não existe memória, embora escritas por personagens insignificantes, que não apresentem valores sociais e pitorescos de primeira ordem”.

(Tomasi di Lampedusa - Os Contos)

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sexta-feira, 19 de julho de 2013

PROJETOS

"Palavras por palavras. Comprometa-se  a terminar as coisas". Escreve Anne Lammoot.



Curiosa. Aprendiz eterna. Incansável. Avolumam-se trabalhos: crochê, tricô. Iniciados. Aos pedaços. Em gavetas. Em caixas. Fiéis depositárias. Amostras várias. Artesãs se irmanam. Transferem aprendizado. 

Arquivos no computador recolhem retalhos. Textos. Fotos. Blogs passam a registrar momentos.

Até que... Uma palavra... Projetos!?...

Sim! Projetos! Como poderia eu omiti-los em minha própria vida?

Eles permeiam nosso universo. Salas de aula. Estudos apontados. Trabalhados. Compartilhados. Porém... O dia a dia. O fazer necessário não os torna projetos. Por quê?

Fora a palavra neste dia frio de julho – 2013 – em que Lee Albrecht diz sobre seus inúmeros projetos de bordados – “mais um entre tantos”.

A palavra se agiganta. Dimensiona meu sentir inquieto. Cresce em mim.  Projeto ronda meu pensar. Toma forma. Faz-me vasculhar gavetas. Armários. Caixas de arquivos.

Bicos para toalhas de banho, de copa. Coletinhos. Aguardam o acabamento final. Pontos sobre pontos que lhe trarão o acabamento almejado.

Ah! Pedaços de textos incompletos. Registrados clamam conclusão. Ideias lançadas entre lãs, linhas e palavras.

Projetos soltos sem projetos passam a reclamar os tais. Projetos.

Manhãs podem ser cúmplices. Noites de insônia concluem tantos. 

Apontamentos se fazem necessários. O projeto passa a ser concreto. Real.

- “Termine o que começou antes de partir para o próximo”, ecoa a voz doce e suave de minha mãe. São lembranças de minha meninice entre linhas.

De repente passo a perceber que ao meu redor sempre havia mais do que um trabalho em execução. Encomendas. Presentes. Pessoal. Podia exercitar a mente. Cada qual ao seu modo ocupava espaço. 

O passado se torna claro ante meu questionamento. O presente, numa rápida pincelada, delineia traços entre lãs e linhas. Prossigo...  


O acabamento. Momento de decisão a demandar processo delicado e demorado. Detalhado. Ponto sobre ponto. O tempo a passar a limpo. As horas que não podem ser contadas. Ajustes a serem articulados.

Percebe-se impossível o fazer por fazer. E me questiono:

- Há propósito? Há projeto? O que aconteceu?

A resposta dá-me alento. 

Anos acrescentados conta muito. Faz diferença. Décadas computadas. Ausências várias. Referências que o tempo pode cobrar.

Posso deter mais tempo livre para o diletantismo, mas também ser usurpada das minhas horas, sem que, muitas vezes o perceba.

Estanco ante os sinais. Minha neta de cinco anos aponta seus projetos mensais na escola. Amigas compartilham projetos seus.

Crochê irlandês extasia-me. A ele me rendo. 

Pesquiso. Estudo. Esboço primeiros passos. Arrisco uma primeira peça. Ao caos dou forma. Coloco meu espírito de artesã curiosa. 


Passo a unir folhas, flores, galhos disformes. A renda colorida aos poucos toma forma.  Concluo o trabalho. Deliro. Vibro. Olho sem cansar sua forma. 


Pequeno colete. Acho bom. Destino certo. Rafaela, minha neta.  Aguardo por seu olhar vibrante. Seu sorriso terno de criança. E parto em busca de outros projetos que não tardam a me envolver.

Agora os tenho projeto.

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São Carlos 19/07/2013 - Inajá Martins de Almeida

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